A IRA secundária a agentes nefrotóxicos é uma condição frequente. Diversos são os agentes causadores como medicamentos, suplementos, hormônios, ervas e contraste iodado.
O uso de produtos para alisamento capilar com **produtos químicos** é uma prática cada vez mais frequente e popular em todo o mundo.
Nas últimas décadas ocorreu a substituição de produtos à **base de formaldeído por derivados do ácido glicólico** (Glyoxyloyl Keratin Amino Acids e Glyoxyloyl Carbocysteine), sendo comumente utilizado a propaganda de **produtos “livres de formaldeído”.**
Este artigo muito interessante publicado no AJKD ([link](https://www.ajkd.org/action/showPdf?pii=S0272-6386%2823%2900006-9)), descreve achados clínicos de uma série de casos IRA associada a produtos de alisamento capilar em Israel (período 2019-2022).
### Características e Desfecho dos pacientes
Os 26 casos de IRA associada a tratamento de alisamento foram identificados em 14 centros médicos de Israel. Todas as pacientes eram mulheres, mediana de idade de 28,5 anos, a maioria sem doenças prévias. A Creatinina de admissão foi 4,2±2,4mg/dl, chegando a um pico médio de 5,3±mg/dl. O exame de urina identificou cilindros granulares em 2 pacientes, não evidenciou cristais e 9 pacientes (35%) apresentaram proteinúria leve.
Biópsia renal foi realizada em 07 pacientes, em 05 **foram identificados múltiplos cristais depositados nos túbulos renais** e exibiam birrefringência positiva sob luz polarizada, compatível com diagnóstico de **Nefropatia por Oxalato.** Todas as 07 biópsias apresentavam sinais de dano tubular agudo. Em 04 biópsias foi notado infiltrado inflamatório.
**Desfecho**
O tempo de internação teve mediana de 6 dias. Dos 07 pacientes submetidos a biópsia, 4 foram tratados com corticoides devido evidência de infiltrado intersticial. Um total de 03 pacientes apresentaram necessidade de iniciar diálise, mas nenhum ficou dependente de diálise.
No seguimento de 18 dos 26 pacientes, todos apresentaram recuperação da função renal no período de 1-2 meses.
A apresentação clínica após exposição associado com achados de biópsia renal sugeriram fortemente o diagnóstico de intoxicação por produtos de alisamento causando Nefropatia por Oxalato.
### Aprendizado com o estudo
Produtos contento derivados do ácido glicólico são metabolizados para oxalato, logo, quando em excesso, pode ocorrer nefrotoxicidade por lesão tubular com deposição de cristais de oxalato de cálcio nos túbulos renais, causando assim a Nefropatia por Oxalato.
Estima-se que a Nefropatia por Oxalato seja subdiagnosticada, mas que pode variar de 1-4% das biópsias renais. Diante de um paciente com diagnóstico de Nefropatia por Oxalato não é possível saber a etiologia em cerca de 50% dos casos. É comumente descrita em casos de sobrecarga de oxalato (intoxicação por etilenoglicol ou consumo elevado de vitamina C).
Derivados do ácido glicólico são comumente utilizados na indústria de cosméticos e são habitualmente descritos como seguros e sem toxicidade local ou sistêmica. Casos em que ocorre lesão de pele podem causar aumento da absorção sistêmica, aumentando o risco de lesão renal.
Diversos são os fatores que podem influenciar na absorção do ácido glicólico na pele, como pH do produto, concentração e duração da exposição e propriedades lipofílicas, bem como lesão da pele.
A ANVISA já informou que os produtos que utilizam o ácido glioxílico com a finalidade de alisamento/relaxamento dos cabelos estão irregulares e ainda não existe uma regulamentação para seu uso como princípio ativo.
Esse foi um relato de casos pitoresco, mas que certamente pode ocorrer no nosso dia a dia, tendo em vista a falta de regulamentação.
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