Com a melhora no tratamento dialítico a gestação em mulheres dialíticas está cada vez mais comum, variando de 0,3-2,2% ao ano na hemodiálise e em torno de 0,5 % ano na diálise peritoneal.
Os desfechos materno-fetais não são animadores, com elevadas taxas de pré-eclampsia, parto prematuros e restrição de crescimento.
### O que o nefrologista deve estar atento?
Atenção especial deve ser dada para intensificar o regime e dose de diálise. Oferecendo uma diálise de qualidade iremos reduzir o risco de polidrâmnio, garantir nutrição materna, garantir peso fetal adequado conforme idade gestacional e atingir uma sobrevida feral em torno de 90%, apesar de elevadas taxas de restrição de crescimento e prematuridade.
Não existe uma dose de diálise ideal. Mas uma abordagem prática pode ser a seguinte:
Devemos passar para o esquema de diálise diária (**06 sessões por semana**). O motivo é os níveis de ureia impactam diretamente nos desfechos fetais. Ao manter uma ureia constantemente baixa reduzimos as toxinas urêmicas e o efeito osmótico causado pela ureia. Por isso não só a dose é importante, mas também a frequência.
O tempo semanal de diálise é um tópico em debate. Alguns autores recomendam 36 horas semanais, algo impraticável na realidade brasileira, já que hemodiálise domiciliar não é amplamente disponível.
Baseado em um estudo brasileiro que avaliou 93 gestações realizado no HCFMUSP pelo Dr. Cláudio Luders, oferecer um tempo semanal de diálise > 16 horas com meta uma ureia pré-diálise no meio da semana de 75 mg/dL ([**link**](https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC6127404/)) se associou com bons resultados fetais. Achamos que esse estudo atende melhor as necessidade da realidade brasileira, no entanto, um alvo de ureia entre 75 e 100 mg/dL pode também ser considerado.
### Pontos importantes da prescrição de hemodiálise
Sessões mais frequentes, mínimo de 06 sessões por semana
- Utilizar capilar de alto-fluxo e alta eficiência (>1,6-1,8 m²)
- Tempo de diálise individualizado, mas devemos tentar >16 horas semanais. Um tempo >36 horas é orientado por alguns autores
- Evitar UF muito elevada para reduzir risco de hipotensão e hipoperfusão fetal
- Composição do dialisato
- Preferir banho com Ca 3,0-3,5 mEq/L
- Atenção com hipocalemia e hipofosfatemia
- Manter bicarbonato pré-HD entre 18-20 mEq/l
- Eritropoetina e Ferro venoso são seguros
- Análogos de vitamina D (calcitriol/paricalcitol) são seguros.
- Não utilizar sevelamer ou cinacalcete
Sempre que possível devemos avaliar níveos de bicarbonato, potássio e fósforo pré-HD (do meio da semana), pacientes com diálise mais intensiva estão sob risco de **alcalose metabólica, hipocalemia e hipofosfatemia.**
### Além da prescrição de diálise, quais outros cuidados em preciso ter?
**Suspender medicamentos teratogênicos**
Ficar atento aos medicamentos em uso, revisão todos os medicamentos em uso que podem ser efeito teratogênico e suspender.
**Devo iniciar algum medicamento?**
Como a gestação de paciente em diálise é de alto risco, devemos tentar prevenir ao máximo de pré-eclampsia.
Para isso devemos iniciar precocemente (antes da 12ª semana de gestação) o AAS 100mg/dia e a reposição de carbonato de cálcio 1g/dia, caso não exista contraindicação.
Não devemos esquecer do ácido fólico 5mg/dia.
**Aspectos nutricionais**
Existe a recomendação de ingesta proteica mais elevada, 1,5-1,8 g/kg/dia. Não é necessário restringir alimentos rico em fósforo, lembrar que faremos uma HD mais intensa e as pacientes frequentemente apresentam hipofosfatemia.
Ocorre um ganho de peso de 1-2 kg no primeiro trimestre e aproximadamente 500 g/semana após esse período. Na avaliação do ganho de peso devemos avaliar edema, congestão pulmonar, pressão arterial.
**Controle pressórico**
O alvo pressórico é de uma PA < 140/90 mm Hg, aqui devemos ficar muito atentos, se paciente hipertensa e com peso seco ajustado, deveremos iniciar hipotensores seguros na gestação (nifedipina, anlodipina, hidralazina, metildopa).
Mais uma vez chamamos atenção da necessidade de reavaliação constante do peso seco para garantir a euvolemia e evitar UF elevadas pelo risco de hipotensão.
Caso paciente após a 20ª semana de gestação passe apresentar níveis tensionais persistentemente elevados apesar da otimização do tratamento medicamento e volêmico, devemos ficar atentos pelo risco de pré-eclampsia e de desfecho fetal desfavorável.
### Em relação aos cuidados obstétricos
Devemos ter em mente que toda gestante em programa de hemodiálise é considerada como **gestação de alto risco**, logo, deve ser acompanhada em um serviço obstétrico de referência.
O acompanhamento com equipe de obstetrícia habitualmente quinzenal até a 30ª semana e semanal até término da gestação, porém os diversos serviços possuem protocolos diferentes.
Devemos ficar muito atentos aos exames de imagem para a presença de polihidrâmnio. Caso a paciente apresente polihidrâmnio devemos avaliar a necessidade de **aumento do tempo de diálise**, e checar os **níveis de ureia**, aqui devemos lembrar do efeito osmótico da ureia, que ao passar para o feto pela placenta irá causar diurese osmótica e polihidrâmnio. Outra causa de polihidrâmnio pode ser hipercalcemia, neste caso devemos suspender a reposição de cálcio oral e reduzir o cálcio do banho de diálise.
O parto geralmente deve ser realizado com 37 semanas, não parece existir benefício que a gestação se estenda por mais tempo. Cuidado especial deve ser dado a programação do parto, uma vez que as pacientes recebem heparina nas sessões de hemodiálise. A maioria das mulheres pode se submeter com segurança à indução do trabalho de parto e ao parto vaginal; a cesariana é realizada para indicações obstétricas padrão.
O que achou destes pontos? Qual é a sua experiência com o manejo de gestantes em diálise? Fala para gente as principais dificuldades encontradas no dia a dia.