Sempre que vejo falar sobre onconefrologia eu penso... lá vem um monte de droga nova, com vários efeitos colaterais e não consigo me atualizar tão rápido assim (acho que nem os oncologistas conseguem.
Este artigo de revisão veio tentar simplificar e aproximar o nefrologista da oncologia e trazer de forma simplificada o que aconteceu de novo nesta especialidade, que corre numa velocidade maior do que as demais, e que o nefrologista precisa saber.
Como a revisão ([link](https://journals.lww.com/kidney360/Fulltext/2023/02000/Onconephrology_2022__An_Update.19.aspx)) foi feita por nefrologistas, ela não foi separada por drogas ou tipos de neoplasia, mas sim por síndromes nefrológicas. Falaremos então das **novidades da onconefrologia** sobre:
1. IRA
2. Distúrbios hidroeletrolíticos
3. Hipertensão
4. Doenças glomerulares
5. Lesões renais relacionadas ao transplante de medula óssea
6. Paraproteínas e mieloma
7. Transplante renal
Não se assuste! Será bem prático e resumido! Vamos, lá?
### 1-IRA
A IRA relacionada aos inibidores de checkpoint (IC) tem sido cada dia mais relatado e novas evidências foram descritas sobre as características e prognostico desta lesão. Essa classe de drogas age permitindo com que a célula T mantenha-se ativa (um dos mecanismos de proliferação neoplásica é a inativação das células T) e elimine as células cancerígenas. No entanto, a ativação destas células pode gerar ativação imunológica e, nos rins, causar IRA. **O principal mecanismo é a Nefrite Intersticial aguda!**
Em um artigo recente com 400 pacientes com IRA após uso de IC (83% com NIA) mostra que **a lesão renal ocorreu em média aos 4 meses e o uso de inibidores de bomba de prótons, DRC e doença imune preexistente foram fatores de risco para IRA**.
O tratamento deve ser realizado com corticoide por 14 dias (esteve associado à maior chance de recuperação).
Bem interessante é que cerca de 30% dos pacientes foram reexpostos à droga e apenas 16% apresentaram nova NIA (isso é importante pois a maioria não recidivou e o paciente manteve seu tratamento padrão, sem diferença em morbimortalidade em relação àquele que não apresentou NIA! Essa informação tem muita utilidade prática!)
Não podemos esquecer da pseudo-IRA! Novas drogas podem causar elevação de creatinina devido à diminuição da excreção tubular e simular IRA.
Três classes de drogas foram recentemente associadas ao pseudo-IRA:
- Inibidores da tirosina quinase de transição mesenquimal-epitelial (MET tyrosine kinase): Capmatinib, Tepotinib
- Inibidores da poliadenosina difosfato ribose polimerase (inibidores da PARP): Olaparib, talazoparib
- Inibidores ciclindependentes das quinases 4 e 6 (CDK4/6 inhibitors): Palbociclib, ribociclib foram recentemente associados ao pseudo-IRA
Sabemos que é difícil mesmo! Mas se você estiver diante de pacientes com elevação de creatinina em quimioterapia, não esquece de avaliar se o paciente pode estar diante de pseudo-IRA e solicitar cistatina ou método cintilográficos para avaliar estes pacientes (outra dica seria avaliar a curva de elevação da creatinina que deve estar mais estável na pseudo-IRA e em elevação progressiva na IRA).
### 2-Distúrbios Hidroeletrolíticos
Lise tumoral: precipita hipercalemia, hiperfosfatemia, hipocalcemia e hiperuricemia. Recentemente tem sido associado a novos agentes para tratamento de linfoma de células B como: Venetoclax, o anticorpo monoclonal Obinutuzumab e até mesmo inibidores de checkpoint. Embora os dados sobre tais associações estejam relacionados a relatos de casos e série de casos
Hiponatremia: o Selinexor é um inibidor seletivo da exportação nuclear proteína exportina 1 e é aprovado, em combinação com dexametasona, para o tratamento de **mieloma múltiplo ou linfoma de grandes células B** **refratário**. O Selinexor pode causar hiponatremia com incidência variando de 7% a 26%.
Classicamente, falamos de hipertensão na oncologia com o uso de cisplatina. No entanto, as drogas que inibem o fator de crescimento endotelial vascular (VEGF) ganharam muita importância recentemente.
Várias drogas tem ação direta e indireta nesta via ocasionando inibição da produção de óxido nítrico, aumento da produção de endotelina, rarefação da camada endotelial vascular, lesão podocitária e sobrecarga volêmica.
A tabela abaixo mostra as principais drogas que inibem VEGF e a presença de proteinúria e hipertensão.
Desta forma, temos que ficar atentos à presença de hipertensão e proteinúria, especialmente em pacientes de maior risco como pacientes com DRC.
### 3-Hipertensão
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### 4-Doenças Glomerulares
Recentemente, vimos um aumento na descoberta de muitos novos antígenos associados à nefropatia membranosa (NM).
Nesta revisão foram citadas algumas atualizações sobre os novos antígenos associados ao câncer.
- Trombospondina tipo 1 contendo domínio 7A (THSD7A): responde por 1% a 3% dos casos de NM. É também superexpresso em certas malignidades, como vesícula biliar e câncer endometrial. A forte coloração de THSD7A também observado em cânceres de próstata, mama, rim e colorretal.
- Autoanticorpos para o fator de crescimento epidérmico neural tipo 1 (NELL-1) é outra adição recente à lista de antígenos implicados em NM. Existe associação entre a NM associada a NELL1 e malignidades.
- Protocaderina 7: cerca de 21,4% dos pacientes com NM associada a esta proteína tinham uma malignidade.
Outro mecanismo de lesão glomerular causado por drogas antineoplásicas é a ativação celular dos IC causando vasculites e lesões podocitárias. Há séries de casos de achados de lesões glomerulares associados a IC sendo os mais frequentes as GN pauci-imunes e vasculite renal (27%) e Podocitopatias (24%). A figura abaixo mostra a distribuição das lesões glomerulares.
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### 5-Doença Renal Relacionada ao Transplante de Células Tronco Hematopoiéticas
**Doença Renal Relacionada ao Transplante de Células Tronco Hematopoiéticas**
É mais específico mais 2 tópicos me chamou atenção nesta revisão
- O uso de doadores haploidênticos ampliou o número de pacientes elegíveis para esta terapia curativa. Porém, os pacientes que sofrem haploidêntica de sangue periférico repleto de células T transplante hematopoiético (Haplo-HSCT) tem um risco adicional para o desenvolvimento de IRA denominado como "haplostorm-associated AKI". Haplostorm é uma liberação de citocinas (SRC) observada dentro de 14 dias após o transplante que pode induzir IRA. Essa síndrome se caracteriza-se por febre, erupção cutânea, diarréia, vazamento vascular, hipotensão e disfunção orgânica multissistêmica, incluindo IRA.
- A doença glomerular mais comum é a NM seguida de doença de lesões mínimas após o transplante de medula óssea. Um estudo publicado por Sethi et al revelou uma nova proteína, protocaderina (FAT1), que foi detectado por microdissecção e espectrometria de massa em pacientes com NM associado ao transplante, todos os quais eram PLA2R negativo.
### 6-Paraproteinemias e Mieloma múltiplo
Um estudo chinês de coorte analisou biópsias renal de pacientes com gamopatia monoclonal de significado renal (GMSR) submetidos a biópsia renal. Cerca de 40% dos pacientes tinha alguma forma de lesão (63% - amiloidose Ig-associada, 9% deposição de imunoglobulina e 8% - microangiopatia trombótica). A nefropatia membranosa (40%) foi a causa mais comum lesão não relacionada à GMSR. **Este estudo expande as várias possibilidades histopatológicas vistas em pacientes com GMSR.**
### 7-Transplante renal
Um estudo observacional multicêntrico investigou a eficácia e a segurança dos IC em receptores de transplante renal. O risco estimado de rejeição aguda foi de 42% e o risco de rejeição foi menor se os pacientes estivessem em um número maior de imunossupressores (por exemplo, imunossupressão de 3 agentes) e os inibidores da mTOR. Outro estudo multicêntrico mostrou que a imunossupressão contínua associado ao tratamento com nivolumab apresentou menor chance de rejeição e nenhuma mudança em resposta ao câncer. **Ambos os estudos concluem que receptores de transplante renal podem receber IC com imunossupressão em curso para evitar a rejeição e não alterações na remissão do câncer.**
Esperamos que você tenha gostado desta revisão! Manda suas dúvidas nos comentários!