### PONTOS CHAVE
- Anemia é uma complicação frequente nos pacientes com DRC. Habitualmente o tratamento consiste na correção dos estoques corporais de ferro e uso de agentes estimuladores/análogos de eritropoetina.
- Este estudo foi uma análise pos hoc do DAPA-CKD em que foi demonstrado um efeito de proteção e correção em pacientes que fizeram uso de dapagliflozina em relação ao placebo.
- Anemia é uma complicação frequente nos pacientes com DRC. Habitualmente o tratamento consiste na correção dos estoques corporais de ferro e uso de agentes estimuladores/análogos de eritropoetina.
- Análise post hoc do estudo CREDENCE foi semelhante, inclusive com menor necessidade de reposição de ferro/eritropoetina em pacientes que receberam canagliflozina.
- Mais um efeito benéfico dos iSGLT2 para tratamento da DRC.
Anemia é uma complicação comum nos pacientes com DRC, ocorre principalmente devido redução da síntese de eritropoetina (EPO) e redução dos estoques corporais de ferro. Até 80% dos pacientes com DRC podem apresentar anemia, o tratamento consiste na reposição de ferro (oral ou venoso) e agentes estimuladores de EPO.
Os inibidores SGLT2 reduzem eventos cardiovasculares e renais em pacientes que apresentam DM2, doenças cardiovasculares (DCV) e DRC. Alguns trials que comprovaram o benefício destes medicamentos na elevação da concentração da hemoglobina (Hb), principalmente a canagliflozina (**[link](https://www.thelancet.com/journals/landia/article/PIIS2213-8587(20)30300-4/fulltext)**).
Este estudo fez uma avaliação de pacientes em uso da dapagliflozina na correção ou prevenção da anemia em pacientes com DRC com e sem diabetes do estudo DAPA-CKD.
## RESUMO DO ESTUDO
**Metodologia**
O DAPA-CKD ([**link**](https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa2024816)) foi um estudo multicêntrico (21 países), randomizado, placebo controlado que avaliou desfechos renais e cardiovasculares em pacientes com DRC no período de 2017-2020.
Foram **incluídos** pacientes adultos, com DM2 e TFGe 25-75 ml/min/1,73m² e Albuminuria (RAC) 200-5000 mg/g, que estavam em uso de iECA/BRA (exceto se contraindicação). Foram **excluídos** pacientes com DM1, DRPAD, LES ou vasculite ANCA.
Randomização 1:1 para receberem placebo ou dapagliflozina 10mg/dia
Medidas de hemoglobina/hematócrito foram realizadas com a seguinte frequência: início do estudo, 15 dias, 60 e 120 dias e então a cada 120 dias até o término do estudo.
O objetivo primário do estudo do DAPA-CKD foi avaliar queda da TFGe em 50% ou evolução para DRC terminal ou morte por causa renal/cardiovascular. Mas esta análise **_post hoc_** se propôs avaliar a evolução dos níveis de hemoglobina e anemia.
Anemia foi definido como Hb 13 g/dl (Ht <39%) em homens e Hb 12 g/dl (36% em mulheres)
Uma diferença de 3% de Ht (isto é 1 g/dl de Hb) foi definido como clinicamente relevante.
Subgrupos pré especificados: idade maior ou menor que 65 anos, TFGe maior ou igual a 45 ml/mim/1,73m² e RAC maior ou menor que 1000 mg/g
**Resultados**
Foram 4.304 paciente avaliados, idade média de 61,8 anos, 33% mulheres com média de hematócrito de 38,9%±5,4% e TFGe 45,4±12,5 ml/min/1,73m². Cerca de 40% dos pacientes possuíam anemia. Ocorreu um seguimento de 2,4 anos.
Comparado aos pacientes sem anemia, aqueles com anemia eram mais propensos a terem DM2, menor TFGe e maior RAC.
Com apenas **02 semanas** de tratamento os pacientes randomizados para receber dapagliflozina **apresentaram maior valores médios de Hb (13,2±2,0 g/dl vs. 12,5±1,9 g/dl)**. A diferença entre os grupos aumentou progressivamente até atingir um platô com 04 meses da randomização, ao término do estudo os níveis de Hb foram **13,2±2,0 g/dl** no grupo dapagliflozina e **12,5±1,9 g/dl** no grupo placebo.
Entre os **pacientes com anemia** ao início do estudo, a evolução para correção do quadro de anemia ocorreu em **53,3%** dos pacientes que estavam no grupo dapagliflozina e **29,4%** no grupo placebo (HR 2,29, IC 95% 1,96-2,68).
Entre os pacientes sem anemia no início do estudo a evolução para anemia ocorreu em 10,4% do grupo dapagliflozina e 23,7% do grupo placebo, mostrando um efeito de proteção do medicamento HR 0,39, IC 95%, 0,31-0,48. A ocorrência de aumento da Ht em ≥ 3% ocorreu em 69% dos pacientes em uso da dapagliflozina e 37% do grupo placebo (HR 2,57, IC 95%, 2,35-2,81).
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Resultados baseados no tempo de dapagliflozina ou placebo em resultados de parâmeris de anemia
## OPINIÃO NEFROATUAL
Esta é um análise _post hoc_ de um importante estudo da nefrologia que demonstrou uma associação da dapagliflozina com elevação dos níveis de Ht, correção de anemia e menor risco de desenvolvimento de anemia em pacientes com DRC (com e sem DM2).
Estudos prévios já tinham evidenciado uma associação com maiores níveis de Hb/Ht em pacientes usando iSGLT2. Recentemente um análise post hoc do [CREDENCE](https://linkinghub.elsevier.com/retrieve/pii/S2213-8587(20)30300-4) mostrou o mesmo efeito, inclusive uma menor necessidade de início do tratamento com reposição de ferro e/ou EPO.
O aumento inicial dos níveis de Ht pode ser atribuído ao efeito diurético, no entanto, os achados dessas duas análises _post hoc_ são importantes para considerarmos ser secundário apenas à hemoconcentração. Os iSGLT2 parecem exercerem efeito de estimular uma maior produção de EPO e exercer um efeito anti-inflamatório, influenciando, portanto, a fisiopatologia da anemia da DRC
Por se uma análise post hoc não pode ser estabelecido um efeito de causalidade direita. Como limitação do estudo muitos dados sobre cinética do ferro não estavam disponíveis, nem dados sobre uso de ferro ou EPO. Valores de Hb nem sempre estavam disponíveis, por isso muitas das análises foram feitas apenas com valores de Ht.
Mais um estudo demonstrando mil e uma utilidades dos iSGLT2, mais um motivo para iniciarmos tais medicamentos nos pacientes com DRC com proteinúria, com ou sem diabetes!