### PONTOS CHAVE
- A prevalência de depressão e ansiedade na população em hemodiálise é alta, é importante considerar uma avaliação sistemática mensal.
- Sintomas como fadiga, hiporexia e baixa adesão medicamentosa devem servir como sinais de alerta, principalmente nos pacientes incidentes em diálise e naqueles com faltas frequêntes.
- O ASCEND foi o primeiro ensaio clínico multicêntrico para investigar o tratamento da depressão em pacientes submetidos a hemodiálise.
- A terapia cognitivo-comportamental e o tratamento medicamentoso são as duas abordagens mais comuns para o transtorno de depressão maior e têm eficácia semelhante na população em geral e dialítica.
- A sertralina pode ser uma opção eficaz para tratar os sintomas depressivos e ansiosos em pacientes em hemodiálise.
###### “Em várias ocasiões, experimentei dores de cabeça fortes, senti meu coração disparar, minhas mãos suando e perdi o apetite. Nos meses seguintes, fui para as sessões através da negação, da raiva e da barganha. A dor que eu experimentei de cada agulha inserida em meu braço, era demais.”
###### “No começo, eu não tinha certeza do que estava causando minha ansiedade. Eu estava constantemente preocupado com minha saúde e o futuro da minha condição. Eu estava com medo do desconhecido e me senti oprimido pelo pensamento de ter que lidar com uma doença crônica. Eu me achei preocupado com o futuro e como eu lidaria com as mudanças físicas e emocionais que viriam com a progressão da minha doença renal.”
###### “Lembro-me da primeira vez que vi alguém desmaiar. A paciente ao lado deles gritou com a enfermeira, e ela correu e conseguiu fazê-la voltar a falar."
###### “Eu conheci uma mulher que se sentava em frente a mim, não consigo lembrar o nome dela. um dia durante diálise, ela caiu inconsciente e deslizou para fora de sua cadeira. O técnico atropelou e eles começaram a fazer RCP bem no chão na minha frente. Eu tentei não assistir. Eu realmente não posso compartilhar esse tipo de experiência com minha família; isso só vai assustá-los”
## Você já escutou relatos semelhantes?
De fato, aproximadamente um terço dos pacientes com DRC em HD apresentam sintomas depressivos. As principais manifestações do transtorno depressivo maior como **anorexia**, **insônia** e **fadiga**, também são comuns entre pessoas em HD.
Pacientes com depressão têm mais dificuldades na adesão à dieta, ao uso dos medicamentos, a se adaptarem aos horários do tratamento e maiores taxas de mortalidade.
Apesar da alta prevalência **a maioria dos pacientes com depressão que estão em HD não recebem tratamento**, talvez por causa de sua relutância em aceitar o diagnóstico ou até mesmo o tratamento. Além disso, as evidências de terapias antidepressivas nesta população são limitadas.
Apesar da escassez de evidências, as clinicas de diálise dos **EUA agora são obrigadas a rastrear pacientes para depressão e documentar um plano de tratamento para aqueles com o diagnóstico**.
## O que temos de evidência mais recente para tratamento de depressão em diálise?
O [**ASCEND**](https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4818161/) (A Trial of Sertraline vs. Cognitive Behavioral Therapy for End-stage Renal Disease Patients with Depression) foi um estudo aberto, de grupos paralelos, multicêntrico, controlado e randomizado. Os participantes foram inscritos entre março de 2015 e agosto de 2017 e foram acompanhados até novembro de 2017
Neste estudo com pacientes em HD de manutenção que tiveram diagnóstico de transtorno depressão maior ou distimia foram **testadas 2 hipóteses**. Os participantes foram designados aleatoriamente 1:1 para ter uma entrevista de convite ou uma consulta padrão
Na fase 1**:** foi investigado se uma entrevista de convite aumentaria a frequência do tratamento da depressão.
- **E****ntrevista convite**: a avaliação foi realizada presencialmente por terapeutas treinados enquanto os pacientes recebiam atendimento ambulatorial hemodiálise. Os terapeutas usaram técnicas motivacionais entrevista para ajudar os participantes a articularem suas ambivalências sobre o tratamento. Participantes também **receberam um DVD de 20 minutos para melhorar sua compreensão da depressão e seu tratamento**.
- **Consulta padrão**: Cada paciente teve uma visita de um membro da equipe de pesquisa durante o qual discutiram as opções de diagnóstico e tratamento do estudo
Na fase 2: foi comparada a eficácia da **terapia cognitivo comportamental (TCC)** vs. **Sertralina** durante 12 semanas. Eles foram aleatoriamente distribuídos 1:1
- **Grupo TCC:** Sessões agendadas, 10 sessões de 60 minutos cada durante 12 semanas, enquanto recebiam hemodiálise ambulatorial.
- **Grupo Sertralina:** iniciado na dose de 25mg/dia e foi realizado titulação da a cada 2 semanas durante as primeiras 6 semanas e então mantido por 6 semanas para determinar a dose mais eficaz e tolerável (objetivo da fase de titulação era atingir uma dose de 200 mg, a menos que ocorressem efeitos adversos.
Desfechos avaliados
**F****ase 1:** proporção de pacientes iniciando tratamento para depressão dentro de 28 dias após a intervenção. O desfecho secundário foi a porcentagem de aceitar o tratamento dentro de 14 dias
**Fase 2:** o desfecho primário foi a avaliação de 16 itens do Inventário Rápido de Sintomas Depressivos–Clínico- Escore classificado (QIDS-C) em 12 semanas. As pontuações foram avaliadas no início do estudo e em 6 e 12 semanas. Os pesquisadores eram cegos para a atribuição do tratamento e avaliaram o score por entrevista telefônica.
**RESULTADOS**
A proporção de participantes que aceitaram tratamento para depressão dentro de 28 dias **não** diferiu entre os pacientes que foram submetidos à consulta convite e o grupo de consulta padrão. (66% vs. 64%, respectivamente; P = 0,77).
Já na fase 2, os escores do QIDS-C diminuíram entre os participantes alocados para o TCC (pontuação antes: 12.2; após 12 semanas: 8.1), bem como aqueles no grupo sertralina (pontuação antes: 10,9; 12 semanas, 5,9). As pontuações de depressão em 12 semanas foram **menores** no grupo sertralina do que no grupo TCC (estimativa de efeito da sertralina vs. TCC: QIDS-C, 1.84; P = 0,035).
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Este estudo é o primeiro ensaio clínico multicêntrico para investigar o tratamento da depressão em pacientes submetidos a hemodiálise, apresentou três principais descobertas.
- Uma entrevista de convite não teve efeito na aceitação do tratamento da depressão pelos pacientes.
- Os sintomas depressivos e vários outros resultados relatados pelos pacientes melhoraram tanto com a TCC quanto com a terapia com sertralina, mas as pontuações dos resultados em 12 semanas foram modestamente melhores para o grupo da sertralina.
- **Os eventos adversos ocorreram com mais frequência no grupo da sertralina do que no grupo da TCC.**
De fato, a TCC e o tratamento medicamentoso, as duas abordagens mais comuns para o transtorno de depressão maior, têm eficácia semelhante na população em geral. As **diretrizes de prática clínica recomendam a terapia como primeira linha de tratamento para depressão leve ou moderada, com a escolha guiada pela preferência do paciente e sua disponibilidade**. Evidências sugerem que, em pacientes submetidos a HD de manutenção, os sintomas depressivos melhoram com TCC em grupo ou individualmente, em comparação com a ausência de tratamento.
Um ponto forte deste estudo é que ele foi conduzido em três áreas metropolitanas e incluiu uma população diversificada de pacientes, o que aumenta a validade externa dos resultados. Entre as limitações do estudo, não foi possível determinar se algum tratamento foi superior ao placebo ou à ausência de tratamento.
Os pacientes que receberam sertralina apresentaram pontuações modestamente melhores na depressão e em outros resultados relatados pelos pacientes em comparação com aqueles no grupo da TCC. Eventos adversos leves a moderados foram mais frequentes no grupo SETRALINA.
## OPINIÃO NEFROATUAL
A prevalência de depressão e ansiedade na população em hemodiálise é alta, e é importante considerar a **avaliação sistemática mensal**, utilizando questionários e perguntas direcionadas à saúde mental e aos **sintomas como fadiga, hiporexia e baixa adesão medicamentosa**. Isso se torna ainda mais relevante para os pacientes recém-chegados à clínica de diálise ou aqueles que apresentam faltas frequentes.
A terapia cognitivo-comportamental (TCC) é uma abordagem sistemática que requer treinamento e tempo adequados. Embora as clínicas de diálise possuam psicólogos, é desafiador fornecer atendimento de qualidade devido ao tempo limitado e à alta demanda.
Diante dessa realidade, a avaliação e o diagnóstico precisos do distúrbio de humor e o tratamento medicamentoso, como o uso da sertralina, podem ser valiosos. Isso ocorre porque a sertralina pode ser uma opção eficaz para tratar os sintomas depressivos e ansiosos em pacientes em hemodiálise.
É importante que a prescrição e o acompanhamento medicamentoso sejam realizados por profissionais de saúde qualificados, levando em consideração a condição médica específica de cada paciente e possíveis interações medicamentosas.
Em resumo, considerar a avaliação sistemática da saúde mental, incluindo a identificação precoce de distúrbios de humor, e o uso adequado de tratamento medicamentoso, como a sertralina, podem ser abordagens valiosas para ajudar os pacientes em hemodiálise a lidar com a depressão e a ansiedade.