### PONTOS CHAVE
- Os inibidores do SGLT2 revolucionaram o manejo de pacientes com DM2, DRC e doença aterosclerótica. Apesar do evidente benefício na doença renal do diabetes, precisamos de mais evidência do uso da empagliflozina em pacientes com DRC sem DM2
- O EMPA-KIDNEY foi um estudo positivo que mostrou benefício de redução da progressão da DRC mesmo em pacientes não diabéticos
- **Paciente com DRC com ou sem DM2 que apresentem TFG entre 20-90 ml/min/1,73m² e RAC > 200mg/g se beneficiam do uso da empagliflozina para redução da progressão da DRC**
- Na análise de subgrupo o benefício ocorreu principalmente nos pacientes com RAC > 300mg/g de creatinina, provavelmente porque o perfil de paciente com doença mais severa. Foi observado uma redução de 17% nos valores de proteinúria
- A taxa de declínio com uso de empagliflozina foi menor do que o placebo, independente da TFGe, presença de DM2 e RAC
## RESUMO DO ESTUDO
**Empagliflozin in Patients with Chronic Kidney Disease** ([link](https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa2204233))
**Revista**: New England Journal of Medicine, publicado em 12 de janeiro de 2023
**Qual a importância e necessidade deste estudo?**
Nos últimos anos os estudos [CREDENCE](https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/nejmoa1811744) e [DAPA-CKD](https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa2024816) mostraram benefício do tratamento com gliflozinas em pacientes com DRC com e sem diabetes com TFGe > 25-30ml/min e RAC ≥ 200mg/g, porém os dados são limitados para pacientes que apresentam TFG < 30ml/min/1,73m².
**EMPA-KIDNEY** _trial_ (_Study of Heart and Kidney Protection with Empagliflozin_) foi um estudo prospectivo muito interessante que avaliou o benefício da empagliflozina quanto a desfechos renais e morte cardiovascular em diferentes cenários de DRC (TFGe e relação albumina-creatinina) em pacientes com fenótipos renais variados (com e sem diabetes).
**Desenho do estudo**
Estudo multicêntrico (241 centros de 8 países), randomizado, duplo-cego e placebo controlado. Foram incluídos pacientes adultos, em uso de IECA/BRA (exceto se ausência de indicação), com os seguintes critérios:
- TFGe 20-45 ml/min/1,73m² (independente da albuminúria)
- TFGe 45-90 ml/min/1,73m² + RAC ≥ 200mg/g creatinina.
**Foram excluídos pacientes** com DM2 com doenças aterosclerótica, DRPAD, transplantados renais, cirurgia bariátrica prévia, cetoacidose diabética < 5 anos, hipotensão sintomática ou hipertensão descontrolada, uso de imunossupressor IV nos últimos 3 meses ou dose atual de prednisolona > 45mg/dia, gestantes, diabetes tipo 1, TGO ou TGP >3x LSN.
Obs.: realizado fase _run-in_ de 06 semanas com placebo, uma pré-randomização, após isso os pacientes foram randomizados para receber:
- Empagliflozina 10mg 1xdia
- Placebo
**Desfecho primário**: desfecho renal composto de progressão de doença renal (TFGe <10 ml/min/1,73m² ou redução 40% TFGe ou morte de causa renal) ou morte cardiovascular. Os **desfechos secundários**: hospitalização por insuficiência cardíaca, morte cardiovascular, critérios de progressão de DRC
Estatística: Realizado análise com subgrupos pré-especificados: DM, TFGe, RAC. Estudo desenhado para ter poder de 90% de detectar uma redução de 18% do evento primário. Todas as análises realizadas com princípio intention-to-treat.
**Resultados**
No período de 2019-2021 um total de 6609 pacientes foram randomizados para o estudo, a idade média foi de 62,8 anos, sendo a maioria homens e 54% dos pacientes **NÃO** eram diabéticos. O diagnóstico de glomerulopatia esteve presente em 25% e hipertensão/renovascular em ~22%. A população DRC foi bem representativa do que acompanhamos no nosso consultório: TFGe 37,3ml/min/1,73m² com uma RAC~329 mg/g. Cerca de 48% possuíam uma RAC ≤300mg/g. A mediana de seguimento foi de 2,0 anos. Ao final do seguimento taxa de descontinuação foi maior no grupo placebo (19,4% vs 16,9%).
**O desfecho combinado de progressão renal/morte cardiovascular foi menor nos pacientes em uso de Empagliflozina, 13,1% vs 16,9% (HR 0,72, IC 95% 0,64-0,82, p<0,001). Avaliando apenas o desfecho de progressão renal, foi observado uma redução de 29% (HR 0,71, IC 95%, 0,62-0,81).**
De uma forma geral, não foram observadas diferenças nos desfechos compostos secundários: morte/internação por IC. Os desfechos foram consistentes nas análises dos subgrupos pré-especificados (DM e TFGe), isto é, mesmo nos pacientes sem diabetes foi observado redução de eventos quando comparado ao placebo, bem como naqueles pacientes com TFG < 30ml/min/1,73m² ao momento da randomização.
A diferença do declínio da TFGe ao final do estudo foi de 0,75 ml/min/1,73m²/ano (variando de 0,54-0,96) demostrando benefício da empagliflozina. É interessante falar que quando observamos os dois primeiros meses de início do medicamento, ocorreu uma **redução mais acentuada da TFGe** (efeito hemodinâmico/adaptativo de correção da hiperfiltração). A taxa de declínio da TFGe foi menor em todos os subgrupos pré-especificados (inclusive nos pacientes com RAC < 200mg/g). Não foram observadas diferenças clínicas sugestivas de proteção para início de diabetes nos pacientes sem DM ou episódios de gota. Não houve evidência do aumento de eventos adversos como cetoadicose diabética, amputações de membros, ITU, IRA ou desidratação.
## OPINIÃO DO NEFROATUAL
Este certamente é um _landmark_ da nefrologia, chama nossa atenção que foi um _trial_ com grande número de pacientes tratados com gliflozina mesmo sem doença renal do diabetes. Foram contemplados pacientes com diferentes faixas de TFGe e albuminúria, com uma parcela significativa (34,5%) apresentando TFGe < 30ml/min/1,73m²
Estudo positivo em que foi observado uma redução de 28% do desfecho combinado de progressão renal/morte cardiovascular da Empagliflozina quando comparada ao placebo. **Pacientes com TFGe 20-90 ml/min/1,73m² + RAC > 200 mg/g certamente apresentam benefício do tratamento com gliflozinas.**
A grande novidade do Empa Kidney foi mostrar benefício na DRC avançada com TFGe entre 20-30ml/min, já que o CREDENCE e DAPA-CKD avaliaram pacientes com >30ml/min e 25ml/min, respectivamente.
Um grande questionamento é se o benefício do medicamento também ocorre naqueles pacientes com DRC e RAC < 300 mg/g – mesmo tendo sido avaliados 3192 pacientes com este perfil, o número de eventos foi limitado neste subgrupo de pacientes, isto traduz uma doença menos agressiva, um declínio mais lento da função renal. Porém, o declínio anual da TFGe foi menor no grupo empagliflozina, independente da RAC quando comparado com placebo.
**Ressaltamos mais um vez que o declínio nos dois primeiros meses já era esperado no grupo Empagliflozina, logo, este declínio inicial não deve ser um critério isolado de suspensão do medicamento.**
Um estudo de alto impacto, porém não podemos estender tal benefício a pacientes com DRPAD, transplantados renais ou glomerulopatias em tratamento de indução com imunossupressão, já que esses foram excluídos do estudo. Algumas limitações: a baixa taxa de eventos cardiovasculares esperadas reduziu o pode estatístico, além disso, o estudo foi encerrado precocemente por conta do benefício, algo que compromete algumas análises secundárias, semelhante ocorreu no CREDENCE e DAPA-CKD.