A nefrite lúpica (NL) ocorre em cerca de 35-45% das pacientes com LES e representa um desafio para nefrologistas e reumatologistas. Diante de uma paciente com NL com formas proliferativas ativas (classe III/IV)
o EULAR e o KDIGO recomendam tratamento padrão com micofenolato mofetila (MMF) ou ciclofosfamida (CFA) em combinação com pulso de metilprednisona, seguido por terapia de manutenção.
Seguindo esse artigo de revisão "Refractory lupus nephritis: When, why and how to treat" ([link](https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S1568997219300576?via%3Dihub)) e capítulo do UpToDate "Lupus nephritis: Treatment of focal or diffuse lupus nephritis resistant to initial therapy"
De forma mais prática, pacientes que NÃO apresentam resposta clínica satisfatória com o tratamento de primeira linha (MMF e/ou CFA) devem ser considerados como tendo doença refratária. Esta condição se associa a pior prognóstico e alto risco de evolução para necessidade de terapia renal substitutiva.
Podemos considerar NL refratária quando não há resposta ao tratamento após 3-4 meses de tratamento padrão ou quando não se alcança resposta parcial após 6-12 meses ou resposta completa após 2 anos de tratamento, mesmo após tentativas com esquemas MMF ou CFA.
Fatores envolvidos com NL refratária incluem não adesão medicamentosa (um dos principais fatores), baixa tolerância aos efeitos colaterais, uso de subdoses, atraso no início do tratamento em centros especializados, além de fatores genéticos e epidemiológicos.
Inicialmente, devemos sempre investigar a não aderência à terapia e tentar entender os motivos, para assim contornar a situação.
Diante de um caso com NL refratária, sem resposta satisfatória após 3 meses de tratamento, como conduzir?
1\. Resistência ao MMF como regime inicial: recomenda-se trocar o esquema para CFA intravenoso + corticosteroides. Esquemas alternativos incluem a combinação de CFA + Belimumabe ou a combinação de MMF com inibidores da calcineurina (ciclosporina, tacrolimo ou voclosporina).
2\. Resistência a CFA como regime inicial: recomenda-se trocar o esquema para MMF + corticosteroides. Esquemas alternativos incluem a combinação de MMF com inibidores da calcineurina (ciclosporina, tacrolimo ou
voclosporina) ou MMF + Belimumabe.
3\. Resistência a CFA e MMF: pacientes que não respondem ao esquema padrão CFA ou MMF, sem resposta ou tolerância à associação MMF com inibidores da calcineurina, podem ser tratados com regimes que utilizam
Rituximabe. Pode-se utilizar associações como Rituximabe + inibidores da calcineurina, Rituximabe + MMF ou Rituximabe + CFA.
Observações:
1\. Tratamentos baseados em elevadas doses de corticosteroides apresentam boas respostas, mas também têm uma elevada taxa de efeitos colaterais.
2\. Esquemas alternativos possuem evidência limitada, logo, devem ser discutidos com pacientes e equipe médica, pesando riscos e benefícios. Devem ser considerados custos, efeitos colaterais e tolerância.
3\. Deve-se ter um baixo limiar para rebiopsiar casos de NL refratários, para avaliar a evolução de lesões agudas para crônicas.
Além disso, é importante mencionar alguns desses esquemas com evidência limitada, mas que podem ser utilizados de forma individualizada para casos selecionados:
\- O esquema MultiTarget (baixa dose de MMF + tacrolimus + corticoide) tem se mostrado efetivo em comparação com a CFA como tratamento de indução e manutenção na população chinesa, mas aguarda-se mais estudos em
outras populações.
\- O estudo BLYSS avaliou o belimumabe em combinação com tratamento padrão, mas seu uso em casos refratários com proteinúria importante não parece ser adequado até o momento.
\- O estudo AURORA avaliou o uso da Voclosporina, um inibidor de calcineurina de nova geração, e demonstrou uma maior taxa de resposta completa em comparação com o placebo em esquema com MMF.
\- O uso de agentes depletores anti-CD20, como o rituximabe, pode ser considerado. O estudo LUNAR não demonstrou benefício em seu desfecho primário, mas esquemas depletores mais intensos, como a associação
rituximabe/CFA (protocolo IBCDT), podem ser alternativas. Estudos observacionais de tratamento de casos de NL refratária mostram o benefício da utilização de esquemas com rituximabe. Uma depleção mais prolongada também pode ser alcançada com o obinutuzumabe, outro anticorpo monoclonal anti-CD20.
\- Abordagens que visam a depleção seletiva de células plasmáticas parecem ser promissoras, e o daratumumabe, um anticorpo anti-CD38, tem demonstrado eficácia em alguns estudos. Como esta série de 06 casos com resultados interessantes como perspectiva futura de tratamento de casos de NL refratários.
Pacientes com NL resistentes têm um pior prognóstico renal, portanto, é importante buscar alternativas terapêuticas, quando possível, para reduzir o risco de evolução para falência renal.
Opções futuras que podem ser consideradas após a falta de resposta aos esquemas padrões incluem o desenvolvimento de outras estratégias de tratamento, como inibidores de proteossoma, plasmaferese e transplante de células hematopoiéticas.