A hipervolemia, além de ser uma das principais indicações de diálise, está associada a aumento da morbimortalidade. Contudo, taxas de ultrafiltração (UF) superiores à tolerância do paciente podem resultar em complicações cardiovasculares, hipotensão intradialítica (HID) e hipoperfusão orgânica, prejudicando a recuperação renal.
Como prever e identificar os pacientes mais tolerantes à UF?
Avaliação clínica
Um fator importante é avaliar se o insulto agudo está em resolução, visto que pacientes criticamente doentes podem apresentar a “síndrome de vazamento capilar”, com hipovolemia intravascular devido ao deslocamento de fluídos do compartimento intracelular para o extracelular. A melhora do insulto inicial está associada à redução da inflamação sistêmica, melhor redistribuição de fluidos e maior tolerância à UF.
Outras variáveis clínicas relevantes são:
* Variabilidade de frequência cardíaca: A ausência de variação da frequência cardíaca durante a diálise é um preditor de HID. Isso reflete a exaustão do sistema nervoso autônomo e a limitação da capacidade de realizar as respostas compensatórias adequadas para a UF.
* Índice de perfusão periférica (IPP): Definido como a razão entre o fluxo de sangue pulsátil e o não pulsátil, é uma medida que reflete mudanças do tônus vasomotor periférico e a perfusão periférica. Este dado é obtido por oxímetros de pulso através do sinal fotoelétrico pletismográfico e valores iguais ou inferiores a 0.82 estão associados a maior risco de HID.
* Monitor de volume sanguíneo relativo: Tecnologia que avalia mudanças do hematócrito e, dessa forma, permite monitorar o reenchimento vascular durante a diálise. Quando se detectam mudanças no volume sanguíneo maiores que -6.5% por hora, há maior risco de HID.
Sugestões de leitura:
Avaliação ultrassonográfica
O ultrassom é uma ferramenta não invasiva que pode ser utilizada para avaliação de sinais de congestão, fluido responsividade e identificar o melhor momento de iniciar a fase de de-ressuscitação. Essa avaliação pode ser dinâmica: realizada antes, durante e após a prescrição da UF, permitindo monitorar alterações hemodinâmicas relacionadas à taxa de UF. Essa abordagem fornece uma estratégia valiosa para guiar a prescrição da UF personalizada, maximizando a segurança e eficácia do tratamento.
* Ultrassom pulmonar: a presença de linhas B sugere hipervolemia e melhor tolerância à ultrafiltração.
* Mensuração de veia cava inferior (VCI): índice de colapsibilidade da VCI menores que 40% sugerem melhor tolerância à ultrafiltração.
* Protocolo VExUS: classificação grau 2 ou 3 sugere hipervolemia e melhor tolerância à ultrafiltração.
* Estimativa da volemia por ecocardiograma: aumento menor que 10 a 15% do débito cardíaco após reposição de fluídos sugere melhor tolerância à ultrafiltração.
Sugestão de leitura:[ Link 1](https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/31881971/) e [Link2](https://bmcnephrol.biomedcentral.com/articles/10.1186/s12882-024-03856-9)
Biomarcadores
* Angiopoetina-2 sérica: Essa molécula é um marcador da permeabilidade vascular e níveis elevados estão associados a maior risco de HID. Outras moléculas inflamatórias, como TNF-alfa e interleucina-1beta, também apresentam associação com HID. Infelizmente, esses marcadores ainda não estão amplamente disponíveis.
* Albumina sérica: Pacientes com níveis de albumina menores que 3g/dL podem se beneficiar de suplementação exógena de albumina, como uma forma de melhorar o reenchimento vascular e redução de episódios de HID. Inclusive, vem surgindo evidências da utilização mesmo em terapias contínuas: dose única de 25g de albumina intravenosa no início da terapia.
* NTproBNP: Níveis elevados de NTproBNP sugerem hipervolemia e menor risco de HID. Podendo ser utilizado como um marcador de necessidade de iniciar a fase de de-ressuscitação do paciente.
* Hipocalcemia: Níveis de cálcio menores que 1.02 mmol/L estão associados a mais HID, provavelmente por efeitos em vasodilatação sistêmica e função ventricular esquerda.
* Copeptina: Este marcador reflete a produção de vasopressina-arginina, cuja elevação é uma resposta compensatória esperada durante a hemodiálise. Pacientes com aumento insuficiente da copeptina apresentam maior risco de HID, indicando dificuldade na adaptação hemodinâmica.
* A integração de ferramentas clínicas, tecnológicas e biomarcadores pode permitir uma abordagem personalizada na prescrição da taxa de UF, otimizando a segurança e os desfechos do tratamento.
Imagem com resumo de parâmetros que podem ser avaliados para guiar prescrição de UF:
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Fluxograma para avaliação da tolerância à taxa de ultrafiltração prescrita:
![](/fluxouf.webp)
Artigo baseado em:
Ultrafiltration Tolerance and Improving Outcomes with Continuous Renal Replacement Therapies ([Link ](https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/39724028/))
Ultrafiltration Tolerance: A Phenotype That We Need to Recognize ([Link](https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/38377967/))