Uma situação frequente no ambiente de diálise é um paciente com DRC e distúrbio mineral ósseo (DMO-DRC) com antecedente de fratura ediagnóstico de osteoporose na densitometria óssea (DXA).
Como manejar tais pacientes?
Este texto foi escrito com base no artigo de revisão [“Diagnosis and Management of Osteoporosis in Advanced
KidneyDisease: A Review”](https://linkinghub.elsevier.com/retrieve/pii/S0272-6386\(21\)00797-6) publicado no AJKD em 2022.
A osteoporose é caracterizada por um osso de baixa qualidade e com baixa densidade mineral, características que aumentam o risco de fratura óssea. A OMS define osteoporose como a redução da DMO com T score ≤ −2.5, isto
é, 2,5 desvios-padrão abaixo do esperado para pessoas com idade entre 20-29 anos do mesmo sexo.
Devemos ter atenção redobrada pois os pacientes com DRC avançada possuem um risco de 3 a 5 vezes maior de apresentarem osteoporose e fraturas quando comparado a população geral, até 24% das mulheres com DRC
apresentam osteoporose.
O KDIGO de DMO-DRC de 2017 recomenda que pacientes com DRC G3-G5D e com DMO-DRC sejam submetidos a DXA e/ou avaliação dos fatores de risco para osteoporose, para avaliação do risco de fratura e tomada de decisão
clínica.
A avaliação com DXA é importante não apenas para diagnóstico da osteoporose, mas também para avaliação seriada. É importante lembrarmos que a DXA nos trará informações sobre densidade, volume e risco de fratura óssea, porém não nos informará sobre o turnover e mineralização.
Avaliação de marcadores de turnover ósseo (MTO) é essencial. O marcador mais utilizado é o iPTH, com sugestão de almejar um alvo de iPTH entre 2 a 9 vezes o valor de referência.
De uma forma geral, e passível de críticas, utilizar a concentração de iPTH > 9 vezes o valor de referência nos possibilitará identificar um paciente com alto turnover ósseo com especificidade de 86%. Bem como, pacientes com iPTH \< 50 pg/mL comumente possuem uma doença de baixo turnover ósseo. Nestas situações a biópsia óssea pode ser prescindível para classificar o remodelamento ósseo.
Porém, a grande maioria dos pacientes então entre esses extremos de valores do iPTH, o que dificulta a classificação em doença de alto ou baixo turnover ósseo.
A fosfatase alcalina (FA) e a fosfatase alcalina óssea específica (FA-OE) são marcadores de formação óssea que não sofrem influência da TFG. Tendo em vista a influência do fígado na FA, a FA-OE é comumente
utilizada como marcador de turnover ósseo. Valores baixos de FA-OE são sugestivos de baixo turnover ósseo.
Apesar disso, os marcadores de turnover ósseo possuem valores preditivos muito variáveis, mesmo quando utilizados em conjunto, sendo muitas vezes necessária a biópsia óssea para melhor classificação do turnover
ósseo.
A classificação do turnover ósseo é essencial para guiar terapia com alvo no turnover ósseo ou mineralização e volume ósseo, para sim definirmos o tratamento.
Como tratar os pacientes renais crônicos com Osteoporose?
A meta é identificar e tratar anormalidades de mineralização e turnover, para assim melhorar a densidade, volume e qualidade do osso. A figura 1 apresenta um fluxograma prático de abordagem.
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**Vitamina D, análogos de vitamina D e Calcimiméticos**
Um componente chave da saúde óssea é a adequada formação e mineralização do osteóide pelo osteoblasto. O calcitriol é um importante regulador deste processo, por isso drogas que agem do eixo PTH/vitamina D previnem
anormalidades da mineralização óssea e osteomalácia nos pacientes com DRC.
Os calcimiméticos (cinacalcete) ativam o receptor cálcio sensível e suprimem o PTH, um dos principais agentes que controlam o turnover ósseo. Desta forma, o cinacalcete pode ser um medicamento utilizado para
prevenir e tratar estados de elevado turnover ósseo. O estudo EVOLVE ([link](https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/nejmoa1205624)) avaliou 3.883 pacientes em uso de calcimiméticos e não conseguiu mostrar o benefício de prevenção de eventos cardiovasculares ou fraturas, porém, no subgrupo população mais idosa e com antecedente de fraturas, ou seja, população de maior risco, foi observado redução da taxa de fraturas.
Desta forma, baseado na opinião de especialistas que trabalham com DMO-DRC, os pacientes em diálise devem ser tratados com análogos de vitamina D e calcimiméticos quando existe a suspeita de doença de elevado
turnover ósseo (comprovado por biópsia e/ou iPTH >9 vezes a referência).
Porém, se apesar da otimização do tratamento com análogos da vitamina D e calcimiméticos o paciente apresentar osteoporose e fraturas, como devemos tratar esses pacientes? É assim que devemos recorrer aos medicamentos
antirreabsortivos e anabólicos.
**Medicamentos antirreabsortivos**
Existem 03 grupos de medicamentos antirreabsortivos: os bisfosfonatos, os inibidores RANKL (denosumabe) e a terapia hormonal. Estes medicamentos podem ser utilizados em pacientes com alto turnover ósseo,
porém a maior parte dos estudos que demonstraram benefício destes medicamentos na osteoporose excluíram os pacientes com DRC.
**Bisfosfonatos**:
Os principais riscos relacionados com bisfosfonatos na DRC são o declínio da TFG e a exacerbação de um estado de baixo turnover ósseo. Em pacientes em diálise que se apresentam com alto turnover ósseo e piora da osteoporose, apesar da otimização de análogos de vitamina D e calcimiméticos, baixas doses de bisfofonatos (ex. alendronato 35 mg oral, 1x semana) podem ser uma alternativa. O tratamento deve ser balanceado com o elevado
risco de fraturas e priora da qualidade de vida associado com o não tratamento, para isso, devemos ter evidência de piora da osteoporose e doença de alto turnover, avaliando parâmetros de MTO/ou biópsia óssea. Sempre importanteexplicar os riscos e benefícios aos pacientes e compartilhar a decisão.
Uma vez iniciado o tratamento com bisfosfonatos é importante o acompanhamento dos parâmetros de MTO durante o tratamento, se possível com FA-OE, um indicador de formação óssea, e NTX (cross-linked N-telopeptides of type I collagen), um indicador de reabsorção óssea.
Muito importante lembrar que após iniciar um bisfosfonato irá ocorrer elevação do PTH em resposta a inibição da reabsorção, logo, PTH deixa de ser um parâmetro de turnover nesta situação.
**Denosumabe**:
De uma forma geral o benefício para prevenção de fraturas é limitado à estudos observacionais, logo, carece de evidências mais robustas. O denosumabe é um anticorpo contra o ligante RANK e pode ser utilizado na DRC avançada com menor risco de toxicidade renal quando comparado aos bisfosfonatos. O principal cuidado que devemos ter é com o risco de hipocalcemia grave que pode ocorrer já na primeira semana de uso e persistir por semanas.
A prescrição do denosumabe (Prolia) dever ser feita da seguinte forma: 60mg via subcutânea a cada 6 meses. Nos pacientes em diálise é interessante monitorar os níveis de cálcio nas primeiras 08 semanas e repor cálcio se
necessário. Podemos inclusive aumentar dose de calcitriol e carbonato de cálcio antes da administração do medicamento e depois reduzir progressivamente conforme necessidade, esta é uma medida efetiva para reduzir o risco de hipocalemia.
Um ponto muito importante é que não devemos descontinuar o tratamento sem planejamento, pois pode ocorrer aumento rebote da atividade osteoclástica. Nestes casos, podemos utilizar terapia com bisfosfonatos após curso com denosumabe.
**Raloxifeno**
O raloxifeno é um modulador do receptor de estrogênio e pode ser uma opção para mulheres com DRC e doença de alto turnover, porém os estudos na população com DRC são limitados. Devemos considerar o risco de eventos
trombóticos, especialmente se as pacientes tiverem histórico de AVC e trombose de FAV.
**Medicamentos anabólicos**
Os pacientes com DRC avançada podem apresentar DMO-DRC com baixo turnover ósseo em até 50% dos casos, desta forma, agentes anabólicos como teriparatide e abaloparatide são opções para tratamento. Diferente dos
bisfosfonatos, não parece ocorrer risco de toxicidade renal, porém os estudos na DRC são restritos a DRC moderada (G1-G4).
Em pacientes com baixo turnover ósseo (iPTH \< 2x o limite da referência, baixa FA-OE e/ou biópsia óssea) o tratamento com agentes anabólicos deve ser considerado. Um grupo de pacientes que pode ter benefício especial são aqueles que desenvolvem osteoporose pós paratireoidectomia.
###### Seguimento do tratamento
Embora os parâmetros de BTM sejam limitados para classificação do turnover, eles podem ser de grande auxílio para monitorar o tratamento, principalmente a FA-OE que será um marcador de formação óssea.
Nos pacientes em que foi iniciado tratamento com agentes antirreabsortivos sem a redução de dos marcadores de turnover ósseo podemos adicionar o cinacalcete, mas devemos monitorar de perto os níveis de cálcio. Além disso, monitorar com DXA a cada 2 anos parece razoável.
Não está bem definido por quanto tempos devemos manter a terapia antirreabsortiva ou anabólica, porém após 02 anos de tratamento podemos reavaliar os parâmetros e considerar interromper ou manter a depender dos
parâmetros de densidade mineral óssea e histomorfometria.
##### Opinião NefroAtual
Em 2017 o KDIGO mudou sua orientação e passou a indicar a realização de DXA em pacientes com DRC avançada, tendo em vista que é um parâmetro importante para predizer risco de fraturas na população com DRC.
Um ponto importante é que diante de um paciente dialítico com osteoporose devemos buscar parâmetros
clínicos e/ou histopatológicos para identificar se o paciente apresenta doença de alto ou baixo turnover.
Antes de considerarmos terapias antirreabsortivas ou anabólicas devemos garantir um tratamento adequado do hiperparatireoidismo secundário. Uma abordagem interessante deste artigo foi chamar atenção para estabilidade clínica, logo, se um paciente apresentasse com osteoporose estável e sem fraturas após otimização do tratamento da DMO-DRC, podemos continuar o tratamento e monitorar. Porém, se após otimização das medidas para DMO-DRC o paciente apresentar piora da osteoporose e/ou fraturas, devemos avaliar PTH, FA-OE e/ou biópsia óssea para avaliar início de tratamento com agentes antirreabsortivos (alendronato ou denosumabe) ou agentes anabólicos.
Diante dos últimos estudos observacionais de segurança com denosumabe, tenho prescrito para os pacientes que se apresentam com osteoporose refratária à otimização das medidas do DMO-DRC e com indícios clínicos de alto turnover ósseo, porém o custo é o principal limitante.