Esse tema foi abordado neste ótimo artigo de revisão publicado no AJKD e intitulado Underdiagnosis of Primary Aldosteronism: A Review of Screening and Detection ([link](https://www.ajkd.org/action/showPdf?pii=S0272-6386%2823%2900579-6)) que aborda o diagnóstico do hiperaldosteronismo primário.
A aldosterona atua nos receptores mineralocorticoides do néfron distal, aumentando a atividade de canais e transportadores, o que resulta em aumento da reabsorção de sódio e secreção de potássio. Além de causar elevação da pressão arterial, o excesso de aldosterona pode afetar o endotélio vascular, cardiomiócitos, podócitos e adipócitos, exercendo um efeito sistêmico.
Descrito por Jerome Conn em 1954, o hiperaldosteronismo primário (HP) resulta na produção independente de aldosterona, sem estímulo da angiotensina II, ACTH ou níveis de potássio.
###### Por que realizar o rastreamento?
O HP é uma doença altamente prevalente e está associado a morbidade e mortalidade elevadas em pacientes não tratados ([link](https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/29052707/)). Principais efeitos deletérios:
* Doenças cardiovasculares: O HP está ligado à hipertrofia ventricular esquerda, espessamento arterial e rigidez, quando comparado a pacientes hipertensos sem HP. Pacientes com HP também apresentam maiores taxas de AVC, fibrilação atrial e doença coronariana em comparação com hipertensos essenciais.
* Doenças renais: pacientes com HP apresentam taxa de declínio da taxa de filtração glomerular estimada (TFGe) mais alta e maior risco de progressão de doença renal crônica (DRC) em relação a pacientes hipertensos essenciais. Uma análise do estudo CRIC mostrou que pacientes com níveis mais elevados de aldosterona têm maior risco de progressão da DRC.
* Doenças metabólicas: a aldosterona reduz a sensibilidade à insulina, aumentando o risco de diabetes tipo 2 e síndrome metabólica. Pacientes com HP também têm maior prevalência de apneia obstrutiva do sono (AOS), e o tratamento com antagonistas mineralocorticoides melhora a severidade da AOS.
A prevalência do HP varia nos estudos (5% a 12%), com cerca de 11% em indivíduos normotensos e até 22% em hipertensos resistentes. A hipocalemia sem causa aparente pode ser um indicativo de HP.
Apesar das orientações, a taxa de subdiagnóstico é alta e não tem diminuído nos últimos anos 15 anos, apesar da orientação dos principais guidelines. Isso é relevante para nefrologistas, visto que mesmo pacientes com hipertensão resistente e redução da TFGe devem ser rastreados quando indicado.
Dados americanos indicam que menos de 2% dos pacientes com indicação de investigação para HP são submetidos a rastreio, uma taxa extremamente baixa. Os principais preditores de um paciente possuir HP são: incidentaloma adrenal, PA persistemente > 150/100 mmHg por > 3 medidas em dias diferentes, hipertensão + hipocalemia independente do uso de diuréticos.
Quais pacientes devem ser rastreados?
###### Devido à alta prevalência do HP, as soiedades de endocrinologia recomendam o rastreamento em pacientes com:
1. Pressão arterial > 150/100 mmHg
2. Hipertensão resistente (pressão fora da meta com ≥ 03 anti-hipertensivos, incluindo um diurético, ou controlada com ≥ 04 anti-hipertensivos)
3. Hipertensão com hipocalemia espontânea ou induzida por diuréticos
4. Hipertensão com apneia obstrutiva do sono
5. História familiar precoce de hipertensão ou AVC
6. Parente de primeiro grau com HP
###### Como realizar o diagnóstico?
###### 1. Rastreamento inicial (figura 1 e figura 2 abaixo):
Antes do rastreamento, garantir condições ideais de investigação:
* Corrigir hipocalemia
* Não restringir sódio
* Suspender medicamentos que afetam o eixo renina-angiotensina-aldosterona
* Manter dose estável de estrogênio
Solicitar dosagem de aldosterona e atividade de renina plasmática (ARP). Considerar rastreamento positivo se relação aldosterona/ARP > 30 e aldosterona plasmática > 15 ng/dL.
###### 2. Testes confirmatórios:
Não são necessários testes confirmatórios para pacientes com alta supressão de renina (aldosterona plasmática > 20 ng/dL e hipocalemia \< 3,5 mEq/L) Para outros casos, indicar algum dos seguintes testes:
* Sobrecarga salina
* Infusão de solução salina
* Teste com captopril ou
* Supressão com fludrocortisona.
###### 3. Confirmar o tipo de hiperaldosteronismo:
O exame de imagem é essencial para avaliação se doença uni ou bilateral. A TC de abdome é o exame de escolha, a detecção de massas >4 cm ou com características suspeitas indica carcinoma adrenocortical e geralmente indica excisão cirúrgica.
Pacientes jovens (\<35 anos) e com imagem sugestivas de adenomas podem ser submetidos a adrenalectomia, porém pacientes mais velhos devem ser submetidos a dosagem de aldosterona e cortisol em amostras de veias renais (com infusão de ACTH), já que até 40% dos pacientes não apresentam alterações de glândulas adrenais apesar da produção excessiva de aldosterona.
Portanto, esse teste é importante para identificar qual a adrenal (direita ou esquerda), essencial quando optado pelo tratamento cirúrgico.
###### Importância destas etapas
Após estas etapas conseguiremos realizar um diagnóstico correto e propor um tratamento mais individualizado e adequado.
A terapia cirúrgica está indicada para pacientes com hiperprodução unilateral. Por isso é tão importante confirmar o tipo de HP.
Não existem estudos controlados que comparem tratamento medicamentoso com o cirúrgico. O que sabemos é que com o tratamento cirúrgico ocorre uma maior redução do risco de fibrilação atrial e redução mais rápida do quadro de hipertrofia ventricular.
A meta é otimizar a dose do antagonista mineralocorticoide até evitar a supressão da atividade da renina plasmática, isto é, uma atividade >1 ng/mL/hora.
O HP pode progredir de gravidade com o tempo, desta forma, a vantagem de diagnóstico precoce é justamente a prevenção de complicações cardiovasculares e renais.
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