Como conduzir um paciente rabdomiólise sob risco de evoluir para IRA? Confere esse artigo no CJASN ([link aqui](https://journals.lww.com/cjasn/fulltext/9900/how_i_treat_rhabdomyolysis_induced_aki_.286.aspx)).
A rabdomiólise é uma condição caracterizada pela destruição das fibras musculares esqueléticas e liberação de proteínas intracelulares para a circulação sistêmica. Nos últimos anos, observou-se um aumento nos casos de
rabdomiólise. Uma das principais complicações da rabdomiólise é a lesão renal aguda (IRA), associada a hospitalização prolongada, aumento de custos e alta mortalidade (\~30%).
A fisiopatologia da IRA por rabdomiólise é multifatorial e envolve hipovolemia devido ao sequestro de líquidos para os músculos e liberação de mioglobina, causando toxicidade direta ao epitélio tubular renal. A mioglobina causa vasoconstrição na microcirculação renal, resultando em injúria por isquemia. Além disso, a mioglobina pode precipitar-se com a uromodulina (proteína de Tamm–Horsfall) e causar obstrução nos túbulos renais.
Quais as principais etiologias da rabidomiólise?
Causas traumáticas: politrauma, imobilização prolongada ou exercício físico extenuante.
Causas não-traumáticas: excesso de ingesta de álcool, drogas recreativas, distúrbios eletrolíticos, desidratação, miopatias ou medicamentos (ex. estatinas).
Clinicamente, os pacientes apresentam-se com mialgia, fadiga e urina escurecida. É importante lembrar que idosos podem ser oligossintomático, além disso, frequentemente apresentam vários fatores de risco, como imobilidade, desidratação, uso de estatinas e miopatias.
Como devemos prevenir e tratar?
Para prevenir e tratar a rabdomiólise, a abordagem principal é a reposição com solução salina isotônica (Soro Fisiológico 0,9% ou Soro Ringer Lactato) para reverter a hipovolemia, restabelecer a perfusão renal e prevenir dano renal. Inicialmente, pode-se iniciar uma reposição volêmica agressiva, seguida por uma redução progressiva conforme a diurese se estabiliza (figura 1).
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Na avaliação inicial podemos iniciar uma reposição volêmica agressiva, isto é, 200-1000 mL/hora com intuito de provocar uma diurese de 2-3 mL/kg/h (aproximadamente 200 mL/hora). Se a diurese inicial é satisfatória, podemos reduzir a hidratação progressivamente, mas a hidratação agressiva dever ser mantidas até que os níveis plasmáticos de CPK caiam para \<5.000 U/L.
Porém, se o paciente não apresenta diurese satisfatória, devemos estar atentos para redução ou interrupção imediata da hidratação venosa, para evitar evolução para sobrecarga hídrica.
Devo fazer reposição de bicarbonato de sódio?
A reposição de bicarbonato intravenoso deve ser reservada para casos de pH urinário \<6 e CPK >30.000 U/L, ou em presença de acidose metabólica e hipercalemia.
Não podemos esquecer que a reposição de bicarbonato até pode promover a solubilidade e excreção da mioglobina, porém pode induzir a deposição tubular de fosfato de cálcio e dano renal. Uma vez que iniciamos a
reposição de bicarbonato de sódio temos que monitorar o pH urinário e interromper reposição de pH urinário >7,0.
Devo utilizar manitol?
O uso de manitol não é recomendado rotineiramente devido ao risco de hipovolemia. Em teoria, o uso de diuréticos osmóticos, como manitol, pode reduzir o edema muscular e assim causar uma menor liberação de mioglobina
e menor formação de cilindros tubulares. Porém esta conduta pode causar hipovolemia, e por este motivo, não deve ser utilizado de rotina.
Quando devemos considerar diálise?
A mioglobina possui um peso molecular de 17 kDa e pode ser removível em uma sessão de diálise, porém NÃO devemos indicar terapia renal substitutiva (TRS) com intuito de retirar mioglobina da circulação sistêmica
para prevenção do dado renal, essa estratégia carece de evidências.
A indicação de TRS fica reservado para Pacientes que evoluem com IRA severa e quadro de hipercalemia, hipocalcemia, uremia e sobrecarga volêmica refratários às medidas conservadoras.
É crucial monitorar os níveis de cálcio, especialmente em pacientes com uma trajetória bifásica, e tratar a hipercalcemia, se necessário, com hidratação, calcitonina e/ou terapia renal substitutiva.
Aproximadamente 1/3 dos pacientes apresentam uma trajetória bifásica em relação aos níveis de cálcio. Em uma fase inicial, durante a fase oligúrica, ocorre uma extensa deposição de cálcio no tecido muscular necrótico.
Posteriormente, na fase poliúrica da IRA, ocorre hipercalcemia decorrente da mobilização deste cálcio que se depositou. Esta hipercalemia pode ser mais intensa a depender da suplementação mais agressiva na fase de hipocalcemia. Se hipercalcemia grave ocorre devemos manejar com hidratação, calcitonina e/ou TRS.