Está é uma pergunta frequente na nossa prática que foi revisada por Lorenzo Arnaboldi, Claudio Ponticelli e cols em uma publicação realizada no CJASN e aceita para publicação em 2024 ([link aqui](https://journals.lww.com/cjasn/citation/9900/how_we_treat_dyslipidemia_in_prolonged_nephrotic.406.aspx)). De fato, a dislipidemia é comum na síndrome nefrótica e aumenta o risco cardiovascular e este artigo teve como objetivo abordar o tratamento quando a síndrome nefrótica é prolongada.
Aqui segue o resumos das principais considerações! Fique atento também no resumo no final desse texto!
Começando com um caso clínico:
Um homem de 60 anos foi hospitalizado devido a edema generalizado. Ele apresentava proteinúria (12 g/dia), creatinina sérica de 0.9 mg/dL e colesterol total de 250 mg/dL. A biópsia renal revelou GESF. Ele foi tratado com benazepril, furosemida, sinvastatina (10 mg/dia) e prednisona (1 mg/kg/dia) por dois meses, sem melhora na
proteinúria. Tratamentos adicionais com ciclosporina, micofenolato e rituximabe também falharam. O paciente continuou em uso de benazepril, furosemida e sinvastatina.
Posteriormente, foi hospitalizado devido a um ataque isquêmico transitório. Na nova internação, sua pressão arterial era de 130/80 mmHg, creatinina sérica de 1.2 mg/dL, proteinúria de 10 g/dia, colesterol total de 300 mg/dL, LDL-C de 200 mg/dL e HDL-C de 30 mg/dL. Ele foi liberado com aspirina, dapagliflozina e uma combinação de sinvastatina (40 mg/dia) e ezetimiba (10 mg/dia), com a meta de reduzir o LDL-C para menos de 70 mg/dL.
Você já teve algum paciente assim?
Consequências da Dislipidemia na Síndrome Nefrótica
A dislipidemia nefrótica é caracterizada pela elevação plasmática de lipoproteína, lipoproteínas contendo apolipoproteína B e apolipoproteína A-III, principalmente devido à hipoalbuminemia e à perda urinária de reguladores lipídicos.
A dislipidemia é um fator de risco essencial para eventos cardiovasculares graves tanto na população geral quanto em pacientes nefróticos. O acúmulo de colesterol nos podócitos pode causar disfunção mitocondrial, gerar
espécies reativas de oxigênio, estresse do retículo endoplasmático e redução da autofagia, resultando em disfunção dos podócitos, proteinúria e inflamação, contribuindo para lesão renal.
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Manejo da Dislipidemia
O objetivo da terapia hipolipemiante é reduzir LDL para menos de 70 mg/dL em pacientes de alto risco cardiovascular. As estatinas são os medicamentos de primeira linha, pois inibem a 3-hidroxi-3-metilglutaril-coenzima A redutase, diminuindo a biossíntese do colesterol e possivelmente induzindo efeitos pleiotrópicos
benéficos. No entanto, os efeitos colaterais, como mialgias, elevação das transaminases e diabetes de início recente, são comuns devido a interações medicamentosas. É recomendável iniciar com doses baixas e ajustá-las conforme a eficácia e a tolerância.
Abordagens Inovadoras
Se a combinação de estatina e ezetimiba falhar em reduzir a colesterolemia, podem ser adicionados:
* Terapias adicionais: Anticorpos monoclonais (alirocumabe, evolocumabe) e RNA de interferência pequeno (siRNA) inclisiran.
* Ácido bempedoico: Reduz a síntese de colesterol sem causar sintomas musculares.
* Lipoproteína(a): Redução significativa através de aférese e novas terapias em desenvolvimento como pelacarsen e olpasiran.
Conclusões
A correção da dislipidemia nefrótica é essencial para reduzir os efeitos cardiovasculares e renais associados. Embora não existam limites definidos para iniciar a terapia lipídica ou dados para o momento ideal do tratamento, recomenda-se uma abordagem baseada no risco e na taxa de filtração glomerular estimada. Estatinas são os medicamentos de primeira escolha; em caso de intolerância ou dislipidemia grave, podem ser adicionados ezetimiba, ácido bempedóico, alirocumab/evolocumab e inclisiran. Fibratos podem ser usados para reduzir a hipertrigliceridemia concomitante. Embora não existam estudos randomizados disponíveis, sugerimos o uso dos agentes disponíveis para alcançar a meta de LDL-C abaixo de 100 mg/dL em pacientes nefróticos sem doença cardiovascular, abaixo de 70 mg/dL para aqueles com doença renal crônica estabelecida e abaixo de 55 mg/dL para pacientes de muito alto risco cardiovascular.
Opinião do NEFROATUAL:
Este artigo aborda a importância crítica de limitar o tratamento da dislipidemia prolongada em pacientes com
síndrome nefrótica, especialmente aqueles com alto risco cardiovascular. A correção da dislipidemia é fundamental para reduzir os eventos cardiovasculares e os efeitos diretos sobre os rins (não podemos esquecer disto!).
No entanto, alcançar as metas de tratamento é um grande desafio quando há refratariedade à doença de base, como evidenciado pela dificuldade em reduzir os níveis de LDL-C e outros lipídios, mesmo com o uso de estatinas, ezetimiba, e terapias avançadas como inibidores de PCSK9 e ácido bempedóico.
A necessidade de um manejo personalizado, considerando a severidade do perfil lipídico e as interações medicamentosas, é essencial para otimizar os resultados e minimizar os riscos associados.
Você concorda?