### CASO CLÍNICO
Paciente de 50 anos, portador de DRC secundário a doença renal policística autossômica dominante (DRPAD), retorna ao consultório de nefrologia com queixa de astenia, inapetência, dor em quadrante inferior direito e febre (37,8-38º) há 10 dias. Nega sangramento pela via urinária.
Ao exame físico abdominal apresenta volume abdominal aumentado (devido cistos renais) e uma **dor bem localizada** no flanco direito, sem descompressão dolorosa e com sinal de Giordano duvidoso à direita.
**Antecedentes**:
- DRPAD (classificação Mayo 1D)
- DRC G3 (TFGe 40ml/min/1,73m²)
- HAS
- Aneurisma cerebral (tratado)
- Nefrolitíase por cálculos de ácido úrico
Medicamentos em uso
- Losartana 50mg 2xdia
- Anlodipino 5mg 2xdia
- Atorvastatina 20mg 1xdia
- Alopurinol 100mg 1xdia
Qual seria a hipótese diagnóstica? Como conduziríamos esse caso?
Essas características são sugestivas de **infecção do trato urinário** (infecção de cisto ou pielonefrite), vamos relembrar pontos importantes do manejo?
[INFECÇÃO URINÁRIO EM PACIENTES COM DRPAD](#)
**Quadro clínico**
Infecção de cistos e pielonefrite são infecções frequentes nos pacientes com DRPAD. Devemos ficar atentos pois se não adequadamente tratados existe o risco de evolução para abscesso renal e bacteremia.
Temos que ficar atentos na dificuldade de documentar esta infecção, pois os cistos não se comunicam com sistema coletor, logo, a cultura de urina é frequentemente **negativa**. _Escherichia coli_ é a principal bactéria envolvida (75% dos casos).
**Dica**: em pacientes com DRPAD e transplante renal devemos manter atenção ao risco de infecção dos rins nativos.
**Quais exames devemos solicitar?**
A abordagem é semelhante ao paciente sem DRPAD, não podemos esquecer do exames de urina, cultura de urina e hemoculturas (se possível). É interessante solicitar proteína C reativa para acompanhar a resposta ao tratamento.
**Obs: TC de abdome fica reservado para casos com infecção mais severa (sepse/choque séptico) ou suspeita de obstrução ou abscesso.**
**Como diferenciar uma pielonefrite de uma infecção cística na DRPAD?**
Muitas vezes essa diferenciação é difícil, algumas características que podem nos auxiliar:
- Ao exame físico de um paciente com infecção cística é comum identificarmos uma região específica do abdome com **dor bem localizada**, diferente da pielonefrite que encontramos uma dor em flanco mais difusa.
- O achado de leucócitos na urina fala a favor de pielonefrite, além disso, na pielonefrite a cultura de urina é comumente positiva, oposto do encontrado na infecção cística.
- Exames radiológicos (USG, TC ou RM) podem auxiliar em alguns casos, geralmente nos cistos infectados podem ser encontrados achados similares a hemorragia cística, material denso em seu interior.
**Quais os diagnósticos diferenciais**
- Hemorragia de cistos (dor abdominal que pode cursar com febre baixa, leucocitose e aumento de PCR)
- Nefrolitíase (dor abdominal localizada ou inespecífica)
**Qual antibiótico devemos iniciar?**
Diante de suspeita de infecção de infecção de cisto ou pielonefrite devemos iniciar antibiótico de forma empírica, lembrar da dificuldade de diferenciar pelo quadro clínico.
Se o paciente estiver estável é sugerido início de uma **Fluoroquinolona** ou **Sulfametoxazol-Trimetroprim**, pois são agentes lipossolúveis que possuem maior penetração nos cistos, alcançando um elevado nível de concentração dentro dos cistos.
Caso o paciente esteja internado e não possua risco para infecção por germes resistentes (MDR), deve ser preferido regime IV com **Ciprofloxacino** ou **Levofloxacino** do que Ceftriaxone ou Piperacilina-tazobactam. Aqui devemos ter em mente que beta-lactamicos e aminoglicosídeos possuem baixa penetração no cisto.
**Qual tempo de duração do tratamento?**
Se tivermos uma baixa suspeita clínica de infecção de cisto renal/abscesso podemos tratar por **10 a 14 dias**.
Caso exista suspeita de cisto infectado o tratamento deve ser mantido por **4 a 6 semanas**. Se após término deste tratamento a infecção retornar podemos considerar manter o tratamento por até 2 a 3 meses.
**Como manejar casos com infecção refratária ou recidiva?**
Após início do antibiótico é possível ver uma melhora importante nas primeiras 72 horas, se o pacientes persistir com quadro de febre/sintomas gerais após uma semana de tratamento com antibiótico adequado devemos aprofunda a investigação.
Nesse momento devemos solicitar uma **TC de abdome** para identificar as características do cisto infectado e/ou possíveis complicações
- Se identificado cálculo renal impactado será necessário procedimento de desobstrução.
- Se identificado abscesso renal ou perirrenal deverá ser discutido drenagem.
- Se não identificarmos abscessos ou obstrução devemos avaliar as características do cisto infectado. **Cistos infectados grandes (>3-5 cm)** possuem elevado risco de não responderem ao tratamento medicamentoso, sendo muitas vezes necessário drenagem e envio do material para cultura.
Nesse momento o exame de **PET-CT** pode ser muito útil para identificar o cisto infectado e guiar o procedimento de drenagem (vem imagem), caso indicado.
**Nefrectomia** é um procedimento de exceção, pensar na possibilidade em casos refratários de cistos com infecção enfisematosa, cálculos coraliformes com rim não funcionante ou pacientes com infecção recorrente importante.
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Infecção em paciente DRPAD transplantado renal - exame PET-CT com FDG-18F (doi:10.4103/0972-3919.90266)
## PONTOS IMPORTANTES
- Em pacientes com DRPAD com infecção do trato urinário é muito importante buscar diferenciar Infecção cística de Pielonefrite
- Ao iniciar o tratamento devemos preferir tratamento com antibióticos que possuem uma maior penetração nos cistos renais
- Se existe a suspeita clínica de infecção cística devemos manter o tratamento por 4 a 6 semanas
- Ficar atento a não resposta terapêutica e ter um baixo limiar para indicar drenagem de cistos infectados maiores do que 3-5cm