O estudo "Sodium-Glucose Cotransport Protein 2 Inhibitors in Patients With Type 2 Diabetes and Acute Kidney Disease" publicado no JAMA ([link](https://jamanetwork.com/journals/jamanetworkopen/fullarticle/2813460)) em janeiro deste ano aborda a associação entre uso de inibidores de SGLT-2 em pacientes com diabetes tipo 2 e doença renal aguda (DRA) com desfechos cardiovasculares e renais. (JAMA Network Open. 2024;7(1)
Lembrando que DRA são anormalidades na função renal que acontecem até 90 dias após o evento agressor.
Resumindo o desenho do estudo foi assim:
Pacientes com diabetes tipo 2 (DM2) que foram hospitalizados devido à doença renal aguda (DRA) e submetidos à diálise tiveram o início de sua avaliação estabelecido 90 dias após receberem alta, período no qual já não
necessitavam mais de diálise. Após este intervalo, iniciou-se um acompanhamento retrospectivo para comparar aqueles que foram tratados com iSGLT2 e os que não foram. O estudo focou em analisar e comparar o risco de mortalidade, bem como a ocorrência de eventos cardiovasculares e renais adversos entre os dois grupos.
Nesta coorte retrospectiva, foram utilizados dados de um extenso banco de dados global ao longo de duas décadas. Nessa coorte, identificaram-se 230.366 pacientes com diabetes tipo 2 (DM2) e doença
renal aguda que necessitavam de diálise (DRA-D), dos quais 5.319 faziam uso de inibidores de SGLT2 (iSGLT-2) após 90 dias da alta hospitalar.
Para a comparação, um número igual de pacientes não usuários de iSGLT2 foi pareado por índice de propensão, e os riscos de morte (desfecho primário), eventos cardiovasculares adversos maiores (MACE) e eventos renais
adversos maiores (MAKE) foram analisados entre os grupos. MACE inclui eventos como infarto cerebral, acidente vascular cerebral hemorrágico, infarto agudo do miocárdio e choque cardiogênico não fatais. MAKE refere-se à
nova necessidade ou dependência de diálise.
Para facilitar, resumimos em uma tabela os resultados principais
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AHR (Adjusted Hazard Ratio): Relação de risco ajustada, comparando usuários de SGLT2i com não usuários, ajustada por fatores de confusão.
Mortalidade: Porcentagem de pacientes que faleceram durante o período de acompanhamento do estudo.
MAKEs (Major Adverse Kidney Events): Eventos renais adversos maiores, incluindo necessidade de diálise e mortalidade.
MACEs (Major Adverse Cardiac Events): Eventos cardiovasculares adversos maiores, incluindo infarto cerebral, acidente vascular cerebral hemorrágico, infarto agudo do miocárdio, choque cardiogênico e mortalidade.
Quais os motivos aventados para redução de mortalidade e desfecho renal propostos pelos autores?
1\. Melhoria do Feedback Tubuloglomerular
2\. Efeitos Natriuréticos e Glicosúrico:.
3\. Diminuição do Consumo de Oxigênio: Ao diminuir a reabsorção de sódio e glicose nos túbulos proximais, os iSGLT2 podem reduzir o consumo de oxigênio, promovendo um efeito protetor renal.
4\. Produção de Eritropoietina e Hemoconcentração
5\. Proteção Celular contra Lesão Hipóxica: Os iSGLT2 podem proteger as células renais de lesões hipóxicas através de sinalização celular.
6\. Diminuição da Inflamação: Estes medicamentos podem também reduzir a inflamação, o que está associado a um menor risco de desenvolvimento e progressão de doenças renais.
7.Benefícios em Diferentes Contextos de Lesão Renal: Há evidências que sugerem benefícios dos iSGLT2 em casos de sepse, insuficiência cardíaca, contraste e IRA associada a nefrotoxinas...
8\. Redução da Inflamação e Estresse Oxidativo
As limitações e as forças do estudo são as seguintes:
Limitações:
1\. Generalização dos Resultados: A maioria dos participantes era branca, o que pode limitar a generalização dos resultados para outras populações
2\. Viés de Informação: Diferenças significativas em comorbidades e uso de medicação entre os usuários de iSGLT-2 e não usuários podem ter introduzido viés de informação
3\. Dados de Filtragem Glomerular e Laboratoriais: Não foi possível identificar a taxa de filtração glomerular basal.
4\. Identificação da causa da IRA: O uso de códigos da CID para identificar IRA pode ter enviesado a coorte em direção a casos mais graves de IRA
Forças:
1\. Dados Globais de Saúde: Foram utilizados dados globais do banco de dados para avaliar riscos cardiovasculares
2\. Análise de Propensão: Foi aplicado o escore de propensão e análises de sensibilidade para confundidores com resultados consistentes
3\. Tamanho da Amostra: O estudo cobriu aproximadamente 23 milhões de indivíduos em Taiwan, proporcionando uma amostra grande o suficiente para explorar desfechos raros como AKI-D
Opinião Nefroatual
Sabemos há algum tempo que os iSGLT2 são drogas indispensáveis para redução dos desfechos em pacientes com DRC. No entanto, após episódio de DRA a prescrição destas medicações ainda é muito baixa. Neste
estudo, apenas 2,3% dos diabéticos estavam utilizando esta classe de drogas. Assim, as evidências deste estudo apoiam a inclusão dos inibidores de SGLT2 no manejo da doença renal aguda em pacientes diabéticos, considerando seu impacto positivo na sobrevida e na redução de complicações graves.
E você? Está prescrevendo iSGLT2 frequentemente?