Estenose aórtica (EAo) é uma das doenças valvares cardíacas mais comuns, especialmente em pacientes idosos e portadores de doença renal crônica (DRC).
Pacientes com EAo e DRC apresentam maior mortalidade cardiovascular quando comparados a indivíduos sem disfunção renal. Contudo, será que estamos dando a devida importância a essa grave alteração cardiovascular nos pacientes com DRC?
Por que a DRC é um fator de risco para a EAo?
Pacientes com DRC vivenciam consideráveis alterações hemodinâmicas (sobrecarga volêmica), inflamação (toxinas urêmicas) e do metabolismo mineral e ósseo (níveis elevados de FGF-23, PTHi e fósforo), o que pode contribuir para a calcificação cardiovascular e, consequentemente, para uma maior morbimortalidade e progressão da doença valvar.
Este estudo, publicado no NDT ([link](https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC10689189/pdf/gfad116.pdf)), avaliou retrospectivamente mais de 600 pacientes diagnosticados com EAo na Bélgica e França. A progressão da EAo foi analisada por meio de medidas seriadas de parâmetros ecocardiográficos, categorizando os pacientes em dois grupos: rápidos e não rápidos progressores quanto à EAo.
A população estudada tinha uma idade média de 75 anos e taxa de filtração glomerular estimada (TFGe) de 64,5 mL/min/1,73m². Foi observada uma relação inversa entre a progressão da EAo e a função renal, ou seja, quanto
menor a TFGe, maior a progressão para EAo.
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Em comparação com uma TFGe ≥60 mL/min/1,73 m², a progressão da EAo aumentou progressivamente de acordo com o estágio da DRC:
* DRC estágio 3b, OR 2,16 (IC 95% 1,28; 3,62), p \< 0,01];
* DRC estágio 4, OR 3,14 (IC 95% 1,22; 8,17), p = 0,02];
* DRC estágio 5, 4,28 (IC 95% 1,35; 13,62), p = 0,01];
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Os fatores de risco para rápida progressão da EAo foram idade, índice de comorbidades, pior função renal, tabagismo e coronariopatia. O risco de morte por todas as causas e morte cardiovascular foi consideravelmente
maior para pacientes com TFGe \<45 mL/min/1,73 m² (p \< 0,01).
**Opinião NefroAtual**
Este estudo documenta o impacto da disfunção renal na progressão da EAo. Ter DRC é um importante fator de risco para rápida progressão da EAo, resultando em uma maior morbidade cardiovascular relacionada a essa patologia.
Já conhecemos a rápida progressão da EAo em pacientes em diálise; no entanto, este estudo destaca um elevado risco também na população com DRC em fases iniciais da doença.
A retenção de toxinas urêmicas, como o indoxil-sulfato, parece ter efeitos cardiovasculares deletérios importantes, incluindo o aumento da calcificação. A uremia pode ter influência em acelerar a evolução da EAo.
Este estudo deve chamar a atenção do nefrologista para identificar EAo em fases iniciais da doença, ajustando assim o tratamento e intensificando os cuidados com os fatores de risco modificáveis. Além disso, é importante monitorar a progressão da EAo e discutir estratégias de manejo mais eficazes e precoces em conjunto com a equipe de cardiologistas, intervencionistas e cirurgiões cardíacos.